Por Marco Aurélio Velleda, diretor de Política e Formação Sindical do Sindjus
Completamos hoje, dia 18 de março de 2021, os 150 anos da Comuna de Paris, muitos devem estar se perguntando: o que foi a Comuna? Foi a primeira experiência histórica de um governo controlado por operários que administraram a capital francesa (Paris) por 71 dias, com início no dia 18 de março de 1871.
A criação da Comuna de Paris ocorreu no contexto da guerra Franco-Prussiana, que vigorou entre 1870 e 1871, resultando na vitória da Prússia e na unificação dos estados germânicos, dando origem ao Reich (Império) Alemão.
Em setembro de 1870, o exército francês sofreu uma importante derrota para os prussianos. A partir daí uma série de manifestações populares desenvolveu-se na França, resultando inicialmente na queda do Imperador Napoleão III e na instauração da chamada III República. Como resultado, foram convocadas eleições para a Assembleia Nacional pelo governo provisório, liderado à época por Adolphe Thiers. A maioria dos eleitos era republicana conservadora apoiada por pequenos proprietários, apesar desta medida política acirrou-se a divergência de classe no país, em especial em Paris.
Os operários do setores populares da capital pediam reformas sociais, principalmente no que se referia ao direito de propriedade, também lutavam pelo o ensino gratuito e obrigatório sem o controle da Igreja, controle dos preços dos alimentos, o direito de apropriação pelos operários das fábricas abandonadas, a igualdade civil entre homens e mulheres, o parcelamento e adiamento do pagamento de aluguéis para os que estavam em dificuldades financeiras, supressão do trabalho noturno, criação de pensões para viúvas e órfãos, entre outras medidas.
Os trabalhadores assim formaram seu governo através de Conselho da Comuna, composto por 71 delegados eleitos através de sufrágio universal. Destes, 25 eram operários e 12 eram artesãos. Os delegados eram eleitos para cumprir tarefas específicas e seus mandatos poderiam ser revogados a qualquer momento.
Outro detalhe importante é que os salários dos participantes da administração da Comuna não poderiam exceder o salário de um operário médio. Essa postura era vista como um perigo não apenas para as classes dominantes francesas, como também para as europeias.
Frente a essa situação, os exércitos franceses e prussianos passaram a cercar e atacar Paris para abolir a Comuna, chegando através da força e derrotando o governo dos trabalhadores em maio de 1871. Ficando nos seus registros uma parcial de 30 mil parisienses mortos, 45 mil detidos, vários assassinados posteriormente e aproximadamente 100 mil deportados.
A Comuna de Paris ficou na memória histórica do movimento operário como o primeiro governo dos trabalhadores. Muitas dessas pautas de luta da Comuna de Paris ainda estão presentes no nosso cotidiano. Um dos exemplos, é a reivindicação para acabar com os privilégios, reduzindo a jornada de trabalho e defendendo a autogestão operária nas fábricas.
A bandeira de diminuição dos privilégios, 150 anos depois, segue na pauta dos trabalhadores nos tempos atuais. Não concordamos que a casta do Estado mantenha-se intocada, enquanto os trabalhadores sigam pagando a conta para manter tais privilégios.
Também lutamos para que as empresas não sejam fechadas, colocando milhares de trabalhadores na economia informal. Entendemos que o sistema cooperativado e administrado pelos trabalhadores é o melhor sistema de igualdade para manter a renda, sem haver uma sobreposição dos valores, e em um formato de organização em que todos são iguais e têm o mesmo peso na autogestão das fábricas;
Outro exemplo é o controle dos preços dos alimentos, uma pauta que era debatida lá em 1871, e hoje segue atual, pois não temos uma reforma tributária que garanta que quem ganha mais, pagará mais, e quem ganha menos terá uma carga de tributos menor. O que vivenciamos e a lógica do Dom-Quixote às avessas. Em 2020, em plena pandemia de Covid-19, as 32 empresas mais rentáveis do mundo aumentaram seus lucros em 102 bilhões de dólares. O número é superior à média observada nos últimos quatro anos.
A institucionalização do ensino aberto e gratuito, sem intromissão da Igreja e Estado, também é uma das pautas de 1871 que segue atual. Luta esta que ficou mais evidente no atual governo, que partidarizou o ensino, com o discurso “Escola sem Partido”, diminuindo os investimentos na educação e sucateando a ciência. Esta é uma luta histórica dos trabalhadores, que lutam por ensino gratuito e pela valorização da educação.
Também é possível citar que a diretriz da Comuna de Paris, em que os salários de todos devem ser os mesmos de um operário qualificado, segue presente nas nossas lutas. Na atualidade, adaptamos essa reivindicação sob a fórmula que todo político ou todo juiz ganhe o mesmo que um professor, profissão que é balizadora para as demais. Neste cenário, nenhuma professora ou professor poderia receber salários vergonhosos, como acontece aqui no Estado do RS. Na mesma esteira, como parte da luta contra os privilégios da casta política, a Comuna tinha na sua pauta acabar com gastos extraordinários.,
Os operários dos setores populares de Paris também pediam reformas sociais, principalmente no que se referia ao direito de propriedade, que até hoje continua sendo negado e negligenciado pelo Estado. No atual governo, vivenciamos cada vez mais descaso com os povos indígenas, quilombolas e periféricos, sem uma política clara e com um olhar para essas classe. Pelo contrário, vemos o governo abrindo mão de seu papel de proteção e fiscalização, permitindo a invasão das terras através de grileiros e de aglomerados de empresas especuladoras do sistema imobiliário.
Como aponta Engels, e justamente a Comuna demonstrou, que é impossível ocupar a máquina do Estado burguês e colocá-la a serviço da classe trabalhadora, sem a construção de partidos políticos revolucionários e de sindicatos comprometidos em garantir uma sociedade mais justa e igualitária, como o Sindjus/RS, que nas suas bandeiras luta pelo controle popular do Judiciário, defende todas as trabalhadoras e trabalhadores contra qualquer forma de opressão e desigualdade.
August Bebel, deputado revolucionário alemão, no auge do massacre da Comuna declarou no parlamento: “Meus senhores! Por mais condenáveis que possam ser aos vossos olhos as aspirações da Comuna, podeis estar firmemente certos de que todo o proletariado europeu e todos os que levam ainda no peito um sentimento pela liberdade e a independência olham para Paris (…) E mesmo que neste momento Paris esteja sendo esmagada recordo-vos que o principal…na Europa, ainda está por vir e que antes de passarem algumas décadas, o grito de combate do proletariado parisiense – “Guerra aos Palácios, Paz as Choupanas, Abaixo a Miséria e a Ociosidade!” – se tornará o grito de combate de todo o proletariado europeu!”
Hoje, este é o grito de guerra dos trabalhadores de todo o mundo. No Brasil, na Polônia, na África do Sul, na América Central, em todos os lugares a bandeira vermelha da Comuna flutua nas mãos dos revolucionários.
Proletários de todo o mundo, uni-vos!
A Comuna Vive!