Um local de ancestralidade, cultura de matriz africana e de moradores e moradoras em vulnerabilidade social que sentem a ausência do estado e o olhar do poder público sobre suas principais carências, agora vítimas de ataques e ameaças que colocam vidas humanas em risco.
O Coletivo pela Igualdade Racial do Sindjus-RS (CIRS), representado pelo servidor aposentado Luiz Osmar Mendes, juntamente com os dirigentes Osvaldir Rodrigues da Silva e Fabiano Zalazar, visitou nesta quarta-feira (31) o Quilombo Alpes, maior quilombo urbano territorial de Porto Alegre, para atividade de solidariedade e apoio às famílias que habitam o local.
Nos Alpes, vivem hoje 120 famílias em condições precárias de habitação, saúde e segurança. Os habitantes, homens, mulheres e crianças, não têm asfalto e iluminação pública em toda extensão do quilombo. Em 2018, pelo programa Minha Casa Minha Vida, da Caixa Econômica Federal, iniciou-se a construção de 50 habitações populares no local, mas em função da pandemia e de outros entraves burocráticos para a liberação de recursos, as obras estão paralisadas, como explicam moradores do quilombo, reforçando que a cooperativa responsável pela construção está apenas no aguardo da liberação dos recursos. “Cada casa dessa já tem dono, é uma família que vai entrar ali”.
Pessoas armadas invadiram o quilombo na última sexta-feira (26) e seguem rondando o local. A Comunidade fez um boletim de ocorrência e a Brigada Militar está visitando o local para garantir a integridade física dos habitantes. De acordo com relato de integrantes da Frente Quilombola do RS e moradores da comunidade, a tentativa de invasão começou nessa data, quando pessoas desconhecidas foram ao local e demarcaram algumas das 50 casas que integram o projeto habitacional da comunidade. No último domingo (28), por volta das 10 horas da manhã, um carro com quatro homens armados fez ronda no local, e em seguida outros veículos com famílias chegaram com lonas. A Frente então acionou a Brigada Militar e, com a chegada dos policiais, esse grupo armado foi dispersado. Entretanto, permaneceram no local dois carros rondando a comunidade.
O medo do assédio, a violência e a revolta pela lentidão e a burocracia que impedem a conclusão da obra tomam conta da comunidade que vê essas dificuldades ganharem maiores proporções, “principalmente nestes tempos de avanço conservador e relativização, por parte de alguns, do racismo que permeia nossa sociedade”, pontua o secretário-geral do Sindjus, Fabiano Zalazar.
Os moradores estão em vigília no local, revezando-se para poderem avisar as autoridades em tempo hábil em caso de invasão (pois o local fica “longe do asfalto”), sem poder dormir de modo adequado. Devido a essa situação, as crianças da comunidade não têm conseguido ir à escola. Diversos ativistas sociais, parlamentares e lideranças políticas têm visitado o local, como a vereadora Karen Santos (PSOL), que passou uma dessas noites com os moradores e as moradoras em vigília. Como resultado direto da mobilização, a Caixa Econômica Federal comprometeu-se a retomar a liberação de recursos para que a obra seja continuada.
A História dos Alpes
Localizado na zona Sul da capital gaúcha, na Estrada dos Alpes, no número 1300, entre os bairros da Cascata, Glória e Teresópolis, o Quilombo Alpes ocupa uma área de 58,28 hectares, onde vivem cerca de 120 famílias autodeclaradas quilombolas, descendentes diretos e ligados à família de Edwirges Francisca da Silva, vinda de Charqueadas em 1920.
Demarcada pelo Incra, em 2016 e reconhecido pela Fundação Palmares há 20 anos como um Território Quilombola, a exemplo de muitos quilombos urbanos, sofre ameaças e tentativas de invasão ao seu território. “Diversas comunidades tradicionais enfrentam situações semelhantes, além de disputas judiciais e pressão da especulação imobiliária. Por isso, mais do que territórios de convivência, os quilombos são principalmente espaços de resistência”, defende o diretor do Sindjus/RS, Osvaldir Rodrigues.
Com informações da Brasil de Fato e Portal da PMPA